sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Desponte

Oitavo dia do mês do carnaval, sete da manhã e está a caminho do trabalho. Usando seus trajes mais cinzas e um par de óculos marrom escuro, age habitualmente como um ventríloquo – se movendo na direção, que mesmo tendo sido sua escolha, não é onde de fato gostaria de estar. Mas por acaso está, e estar é tudo o que lhe tem permitido ser: está satisfeito com seu trabalho, conformado com sua faculdade, contente por seus amigos e feliz ao lado de quem escolheu e foi escolhido como seu amor. Enquanto controlado no seu estado de graça de pau mandado, deveria manter uma face neutra e de fato mantinha, e vinha mantendo de acordo com o que achava ser neutro. Olhava todos os dias a neutralidade das pessoas perante o acaso e imitava com destreza esse rosto.
O relógio marcava dez minutos depois das nove, faltando menos de três horas para o almoço, quando por intervenção de uma coisa que não soube nomear veio súbito um único pensamento edificado numa palavra: desponte. Nada mais foi o mesmo e não havia como continuar sendo. Tentava, sem sucesso algum, remontar o seu rosto neutro que havia se despedaçado com o eco daquilo que ainda não compreendia, teve a impressão de estar tatuado em sua testa o que lhe havia tirado a segurança do óbvio e a certeza de que todos os seus poros faziam um coro - tudo dedurando o seu estado alterado. Uma rebentação de quem é tocado pela primeira vez, a sensação primeira de se estar sendo preenchido com uma coisa tão grande quanto a loucura.

Um comentário:

  1. acho que despontar é o futuro atom que qualquer um pediu a deus. despontemos. é uma palavra bonita

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